sexta-feira, 28 de abril de 2017

Dobrando proteínas - chaperonas

Dobrando proteínas - chaperoninas

A fita de aminoácidos sintetizada não se transforma em uma proteína globular por si mesma, antes passa por outras proteínas maiores chamadas de chaperoninas.
As chaperoninas possuem uma abertura e um espaço na forma de barril, com grupos que reposicionam os aminoácidos hidrofóbicos para o interior da futura enzima.

estrutura cônica de uma chaperonina, a partir do site https://pdb101.rcsb.org/motm/32. Créditos para David S. Goodsell and the RCSB PDB

Muitas vezes a enzima ainda passa pela remoção de alguns aminoácidos e a cadeia se torna rígida a partir da formação de pontes de dissulfeto. Somente após esses eventos pós-translacioniais a enzima se torna ativa.
A fita de aminoácidos é dobrada por enzimas conhecidas como pre-foldinas, que juntamente com as chaperoninas formam um complexo enzimático que dobra corretamente os grupos, virando as cadeias laterais para formar uma região hidrofóbica que dá a característica globular da enzima.
Essas enzimas orientam a definição do sítio ativo, do sítio alostérico, como se tivessem a memória da estrutura final. As ligações peptídicas se orientam para atingir os ângulos de ligação necessários para que a enzima atinja a sua forma final.
O mau funcionamento das chaperoninas resulta em erros de empacotamento e agregação das proteínas, formando depósitos conhecidos como amilóides, característico de doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer.i Ao aquecer um do ovo, as proteínas movem-se mais rápido, se desdobram um pouco, perdem a sua conformação nativa e precipitam, formando uma estrutura sólida. O resultado é um omelete, e dentro da célula significa a perda de mobilidade das moléculas no citosol e o bloqueio completo das funções celulares.


iTrends Biochem Sci. 1995 Nov;20(11):456-9. Defective protein folding as a basis of human disease.Thomas PJ1, Qu BHPedersen PL.

quinta-feira, 30 de março de 2017

Os maus replicantes

Replicação de moléculas orgânicas


A replicação é a reprodução de uma estrutura inicial. A forma mais comum ocorre quando a molécula original atua um “template” ou molde que atua no posicionamento correto da sequência de monômeros.
As propriedades do molde ou “template” necessárias são a forte interação com o monômero, como interações eletrostáticas, ligações de hidrogênio, dipolo-dipolo, van der Waals e pi stacking. O replicante pode ser igual ao molde original, conforme o esquema abaixo:


Ou o replicante pode ser diferente do molde, e gerar o molde original após uma nova replicação:


No primeiro caso, o molde forma o replicante que é igual ao próprio molde, e conforme a reação avança, mais molde é formado até que esgotem os reagentes. Em ambos os casos a velocidade que ocorre a reação pode aumentar conforme o produto é formado, resultando em uma auto-catálise.
Embora alguns autores apontem que a auto-catálise ocorre automaticamente, isto não é necessariamente verdadeiro, porque depende da etapa de junção dos grupos. Se esta junção não for ativada, a reação para na primeira etapa, quando os ligantes do molde são ocupados, resultando em um bloqueio do ciclo.
Os trabalhos de Julius Rebek demonstraram em derivados do acido de Kemp demonstraram que o produto atua como catalisador na reação de formação da ligação amida.


O modelo de Rebeki mostra o prévio desenho da estrutura para obter a auto-catálise: o molde interage com as moléculas soltas e posiciona os grupos reativos. Nesta replicação, um derivado de ribose (1), reage com uma ftalimida derivada do ácido de Kemp e forma o produto 3, que interage ao mesmo tempo com outra unidade de 1 e de 2, o que aproxima, forma 3, que atua da mesma forma, resultando em um processo auto-catalítico e replicativo.
A reação requer um grupo ácido carboxílico ativado e a base trietilamina para promover a abstração do próton no complexo ativado, enquanto que a associação vem das ligações de hidrogênio entre a ftalimida e a amino-purina. Tanto a reação quanto a associação não ocorrem na presença de água, porque hidrolisam o éster e impedem a associação intermolecular.
A replicação foi obtida e a velocidade aumenta até que o reagente é consumido e neste momento cessa a reação.
Os resultados geraram grande entusiasmo em escritores evolucionistas, como Richard Dawkins, que usou tais sistemas para promover a ideia de uma possibilidade de uma bioquímica distinta, é necessário reconhecer que os elementos presentes na reação são bastante sofisticados, que não seriam disponíveis em sistemas pré-vida: a rigidez das estruturas moleculares, que leva a um correto posicionamento para que ocorra a reação, a complementaridade dos grupos que interagem a ativação do grupo carboxi. A soma destes fatores revela a “inteligência” do cientista que desenhou este sistema molecular reativo, e não a sua aleatoriedade. A replicação requer moléculas “melhoradas” no desenho e na sua capacidade reativa.
Esta replicação é uma pálida imitação dos processos naturais, porque assim que todo o reagente é consumido, ela cessa. Acabou. O sistema químico morreu. Se forem trazidos os conceitos da evolução darwiniana para a química, sistemas puramente replicativos morrem sem ter originado vida. As moléculas que se replicam mais rápido ganham a batalha, mas perdem a guerra.


iSelf-replicating system T. TjivikuaP. BallesterJ. RebekJr. J. Am. Chem. Soc., 1990, 112 (3), pp 1249–1250 DOI: 10.1021/ja00159a057



sexta-feira, 17 de março de 2017

O universo é pequeno demais para nós

A menor enzima conhecida é composta por 62 aminoácidos, o que significa que o RNA que originou é formado de 186 nucleotídios. O número de possibilidades de arranjos aleatórios com 186 nucleotídios é de 9,62 . 10111. Considerando a massa média dos nucleotídios (338,5 g/mol), a massa deste material seria de 3,25.10111 kg. A massa da Terra é de 5,94 . 1024 kg, assim seria equivalente à massa de 5,45 . 1086 Terras e muitas vezes (~1058) a massa do Universo observável, estimada em 1053 kg. Ao afirmar que a origem da vida é aleatória, é necessário lidar com estes números e encontrar os atalhos para formar as sequências que levaram à formação dos primeiros organismos vivos.

terça-feira, 7 de março de 2017

História da vida escrita a ferro
A revista Nature publicou na edição de 2 de março de 2017 um estudo1 que compara depósitos minerais de hematita e outros óxidos de ferro descobertos na região do escudo canadense com aqueles formados por archaea metabolizadores de ferro e observaram uma grande similaridade morfológica.

A rocha em que estão incrustados foi datada por volta de 3,77 bilhões de anos, embora possa ser ainda mais antigo segundo outro método, chegando a 4,28 bilhões de anos. Se isso for verdade, colocaria o início da vida em um tempo muito próximo do resfriamento do planeta.
Esta descoberta também põe em xeque a história do oxigênio contada pelas BIFs (banded iron formation- formações de ferro bandados), que tenta relacionar a formação de BIFs com o surgimento do oxigênio, porque não seria necessário oxigênio para a oxidação do ferro, que agora seria feito por estes seres. Ou seja, ocorre a quebra do vínculo entre o surgimento dos BIFs e o acúmulo de oxigênio no planeta.


Um ponto importante é que o surgimento de BIF tem sido apontado como a evidência para o surgimento do oxigênio, e se os seres metabolizadores de ferro surgiram cedo, existe outra fonte para a formação dos óxidos de ferro em quantidade, e além disso, quebra a ideia que a atmosfera era inicialmente redutora e que o oxigênio foi surgindo aos poucos e capturado pelo ferro, até a sua completa oxidação.


1Evidence for early life in Earth’s oldest hydrothermal vent precipitates Matthew S. Dodd, Dominic Papineau, Tor Grenne, John F. Slack, Martin Rittner, Franco Pirajno, Jonathan O’Neil, Crispin T. S. Little doi: 10.1038/nature21377